BIBLIOTECA
Era um ano desses do início dos 2000, um cinema retirante estava chegando na cidade, o alvoroço entre a molecada estava alto por dois motivos: Conhecer o troço que nos apresentaria um filme e reunir toda a galera num grande evento que movimentaria a cidade. O título do filme era um tanto estranho, um nome em inglês seguido de um subtítulo que também não dizia lá muita coisa. Além de alguns filmes nacionais bem bacanas naquela época, o mistério era descobrir que filme seria aquele em que aparecia um menino de óculos na capa seguido de vários outros personagens bem estranhos. No dia marcado as luzes apagaram-se, a praça encheu-se com o cheiro da pipoca e todos fizeram silêncio porque dali em diante seriam mais de duas horas de esbugalhar de olhos, emoção e magia. Harry Potter e a Pedra Filosofal entrava na minha vida assim como na de muitas outras crianças que dali em diante usariam daquele filme como uma ponta para a magia dos livros, do mundo criado por uma autora talentosíssima e muitas outras fontes de imaginação e do significado do que seja amor. Claro que os anos foram se passando, livros foram sendo lançados, houve leituras realizadas através de empréstimos de amigos solidários e somente bem velho, já quando eu era um adolescente, foi que consegui montar minha própria coleção com toda a história do menino órfão submerso num mundo mágico. Talvez um marco para o sentimento de liberdade financeira e adulta. Risos. Ler apenas uma vez não era um requisito, assistir apenas uma vez também não era requisito. O filme deveria ser assistido várias e várias vezes, deveria ser decorado as falas, lembrado os detalhes de cenário, os feitiços lançados e até, isso não é brincadeira, saber fabricar uma varinha que imitasse os trejeitos da varinha do personagem principal – Quase um aprendiz de Olivaras. Ao fim, a grande magia por trás de todo esse mundo era o fascínio que Harry Potter criava nos leitores. O fascínio pelas releituras, pela descoberta de novos detalhes e em assistir e indicar o tema a novos amigos que magicamente se multiplicavam pelo gosto em comum. Em suma, Harry Potter não foi um fenômeno, mas sim um acontecimento mundial. Agora, quase dez anos depois, é que decido reler toda essa magia mais uma vez, tentando usar dos meus olhos – hoje de velho – para descobrir o que deixei passar, descobrir os pontos de união que liga todos os livros em apenas um e tratar de certos assuntos com mais afinco, detalhes que mostram que o enredo é mais que enredo, é um poço de entendimento sobre o humano. Sendo assim, peguem suas varinhas que nossa viagem por Hogwarts começa mais uma vez. O Início de tudo “O Sr. e a Sra. Dursley, da rua dos Alfeneiros, nº4, se orgulhavam de dizer que eram perfeitamente normais, muito bem e obrigado. Eram as últimas pessoas no mundo que se esperaria que se metessem em alguma coisa estranha ou misteriosa, porque simplesmente não compactuavam com esse tipo de bobagem.” (Harry Potter e a Pedra Filosofal, p. 7). Assim somos introduzidos na história, logo entendendo de cara que iremos nos envolver com um bando de gente estranho, mas como somos (e seremos) mais que estranhos também, que não nos importemos com esse fato, que vistamos nossa capinha da estranheza e embarquemos nessa história sem paradeiro para um lugar mais que estranho também. Às vezes me pergunto como J.K. Rowling conseguiu criar as primeiras linhas desse livro, onde ela estaria e quais seus primeiros pensamentos ao ler na sua própria voz as linhas mágicas que nasciam de sua imaginação. Tudo bem que existe toda aquela história sobre ela andar de trem de um lado para o outro e do nada “Click”, uma bela história que desaponta na sua cabeça. O que me cutuca lá no fundo é saber como ela, logo nos primórdios de um livro que não tinha chance alguma de fazer sucesso, conseguiu criar uma linha de direção que fica tão clara. Quando falo linha de direção, quero dizer no sentido em que a história tomou, nos detalhes microscópicos que apenas numa releitura conseguem florir, fazendo com que a grandiosidade de detalhes maiores nos próximos livros comecem com um semente tão pequena como nesse primeiro. O grande aspecto da história é que J.K. Rowling estava criando um livro que usaria como arco de construção o tema amor em diversos aspectos: O amor de uma mãe que salvou seu filho, o amor dos pais que, mesmo depois de mortos, ainda está semeado no coração de seu filho sob diversas formas, o amor pelas amizades, o amor pela coragem em enfrentar as coisas más da vida e etc, etc, etc. O ponto máximo da história de J.K. Rowling é quando ela mesma, em meio a uma crise de vida, reflete todas as suas experiências num livro que seria o maior sucesso de sua vida. Em resumo: Harry Potter nada mais é que a realização e a busca por um sonho, qualquer que seja, impregnado pela força de ir longe para realiza-lo. “Ele vai ser famoso, uma lenda. Eu não me surpreenderia se o dia de hoje ficasse conhecido no futuro como o dia de Harry Potter. Vão escrever livros sobre Harry. Todas as crianças no nosso mundo vão conhecer o nome dele!” (Harry Potter e a Pedra Filosofal, p. 15.). O que seria esse trecho? Uma frase apocalíptica para o grande sucesso que a série viria ter? O que seria esse “dia de hoje” como o dia de Harry Potter? Seria o 1º de setembro quando milhares de crianças no mundo vibram em saber que nesse mesmo dia o início de um mundo mágico estava prestes a acontecer? A amizade entre Harry, Rony e Hermione Quando se lê Harry Potter e a Pedra Filosofal, principalmente numa releitura em que os elementos que compõem a amizade entre Harry, Rony e Hermione, são vistos de uma forma mais intrínseca no sentido do impossível, fica claro entender que essa amizade é cheia de altos e baixos, principalmente por se tratar de três personagens tão diferentes um do outro. O próprio site Pottermore levanta uma teoria a respeito da criação da amizade entre ambos, já que quase ela não é criada: Os laços de amizade entre Harry e Rony são bem mais simples, uma vez que Harry, ao adentrar num ambiente inóspito, sem pais, excluído do meio em que se encontra, cria uma certa ligação com Rony, um dos últimos Wesley, pobre e também deixado a margem no grupo em que está inserido. Quando o elemento Hermione entra em cena é que a coisa toma outro rumo, já que desde as primeiras páginas fica bem claro que ela é uma garota altruísta, independente e acima do nível dos demais, o que a torna um certo estorvo em comparação aos colegas, que a desprezam e a tomam como chata. A amizade entre ambos começa num ponto em que as próprias características de cada um entram em comum numa certa harmonia. A coragem de Harry torna-se a admiração de Hermione, a inteligência dela torna-se a fuga dos problemas dos três, e quanto a Rony, pela sua lealdade e admiração, a tríade consegue ser formada num todo pelo que o enredo se torna. A graça na criação de J.K. Rowling é exatamente isso, fazer de personagens tão distintos, o ponto em comum que os une, o que é exatamente o que acontece na maioria das amizades na vida real. Não é por sermos iguais a alguém que admiramos esse outro e fazemos dele nosso amigo, mas sim as diferenças que tornam esse outro alguém um ser interessante. Bem versus Mal
Toda a saga Harry Potter é impregnada de valores que denotam o que é o bem e o que é o mal. Harry mora nunca casa cuja família o odeia, sendo repentinamente acolhido por uma escola que o adota como uma nova família; ao chegar nesse novo mundo ele precisa aprender a enxergar os amigos que o rodeiam (os bonzinhos como Rony e os vilões como Malfoy); dentro da escola o menino é visto como uma celebridade tendo como um desses olhares a repugnância e de outros a admiração, alguns professores o admiram enquanto que outros o odeiam (O que falar de Snape, por exemplo). A todo momento Harry precisa lidar com seus e os problemas dos outros, aprendendo o que é o bem, lidando com uma ameaça (daquele que não-deve-ser-nomeado) que aos poucos parece que o engolirá. Harry sempre está do lado daqueles que são menosprezados (Neville), abominando a classe mais favorecida (Os da Sonserina), como num jogo de classes em que imita a sociedade atual. Por diversos trechos dos livros J.K. Rowling joga suas críticas quanto ao mundo moderno disfarçados em pequenos momentos de aprendizado que ela quer transmitir aos seus leitores, principalmente nesse livro em que boa parte deles são jovens em início de formação. De maneira alguma quero dizer que Harry Potter passa a ser um livro político, pelo contrário, mas sim mostrar que as ideologias de um autor sempre transparecem em sua obra, mesmo que de forma subliminar como acontece em Harry Potter. Não é à toa que Harry Potter imita a vida: É necessário se passar num processo para entrar numa casa (Vestibular?), é necessário estar numa casa dentro da escola (Classe social?), apenas quem não quer a pedra filosofal é que consegue tê-la (Visão de sonho?). São simples e poderosos reflexos que mostram que até mesmo as obras fictícias estão impregnadas de valores sociais. E não acaba somente por ai, existem diversos outros temas a serem abordados, isso sem falar nas temáticas que envolvem o próprio imaginário do mundo de Harry Potter. A releitura da saga me abriu os olhos para um nova possibilidade de enxergar o livro, o que facilitou o processo de entender, dessa vez, um pouco de seu processo de criação. Convido a vocês também fazerem o mesmo, pegar os livros parados em sua estante e olharem, não somente com os olhos de fã e leitor, mas sim também com um olhar um pouco critico para entender mais sobre esse fascinante mundo. Em breve volto com mais conteúdo sobre não somente esse livro, mas todos os outros sete que compõem esse mágico enrendo. Por Rodolfo Vilar
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April 2021
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