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Inundado de Clarice | Água viva - Clarice Lispector

8/25/2016

 
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Nunca planejo as leituras de Clarice Lispector. Elas simplesmente acontecem, surgem. Elas vêm até a mim (ou vou até elas) de uma maneira espontânea, divina, enérgica e precisa. Já considero ler Clarice como um ato único, experimental e doloroso que não adianta fugir, é necessário encarar suas palavras (duras ou doces) e crescer com isso, absorvendo o máximo possível. Comecei a leitura de Água Viva às 22:30 de uma quinta-feira e só finalizei às 01:27 da manhã da sexta. Li tudo, de uma única sentada (ou no meu caso, deitada) como se estivesse desesperado, louco, enervado e necessitado de me alimentar daquilo que estava lendo. Eu não era mais eu. O livro não era mais livro. Clarice não era mais Clarice. Éramos uma única coisa, um único ser. Éramos o it, ali, acontecendo naquele estante. Senti-me inundado, afogado em minha própria solidão e naquelas palavras que entravam em mim como farpas quentes que dilaceravam meu coração, minha alma. Como se Clarice conseguisse usar sua própria linguagem para apunhalar aquilo que já estava bem doloroso, mesmo ela não sabendo que coisa era essa que doía. Clarice é carrasca, consegue ser cruel, nos exorciza. Ninguém é mais o mesmo depois de estar dentro da mesma coisa acontecendo. 
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Como o próprio título já diz, ler Água viva é sentir-se vivo, em constante mudança e em total acontecimento. A própria voz do livro (não sei se posso chamá-la de personagem) nos diz isso, que sua escrita é um fluir de pensamentos da mente para o papel. Sem medo, julgamentos ou parcelas. É um vômito próprio que nos impregna e que no momento da leitura passa a ser o nosso vômito, um vômito comunitário. Diferente dos outros livros que já li da autora, em Água Viva Clarice não fala especificamente do amor em correspondência para um outro amor, mesmo essa voz estando a escrever uma carta para certo alguém em particular (para nós mesmos, quem sabe). É nessa obra, assim como nas últimas obras de sua vida e de seu estado de amadurecimento como autora, que Clarice nos fala de um amor mais universal. Um amor ao humano, ao amante, a natureza, as coisas simples, ao amor próprio, do amor aos animais, dos cheiros, das flores, do mundo. Um pensamento intenso que converge para o sentido amplo do que entendemos do amor. Por isso que a obra deixa de ser algo especifico, como nas obras inicias, e passar a ser tratada como uma experiência única onde cada leitor terá sua impressão pessoal à respeito daquilo que o tocou. 
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Não espere de Água Viva um enredo amarradinho e convencional (existe enredo nas obras de Clarice?). O livro diverge de muitos outros e exatamente por isso é considerado vago. Porém, é a obra da Clarice que mais aparece em citações pelas redes sociais. Citações essas tremendamente errôneas na maioria das vezes. Água viva é um livro não linear, com altos e baixos espetaculares (por isso o tanto de frases retiradas avulsamente) e uma experiência única com o leitor. Após o término, quando eu já estava sugado e exausto mentalmente pela leitura, não consegui dormir. Simplesmente passei a noite mais longa da minha vida a pensar sobre tudo aquilo que havia experimentado. Daí outro fator: Posso estar errado, mas considero a leitura desse livro em específico, algo descartável e momentâneo. Digo isso porquê, segundo minha experiência, é impossível guardar detalhadamente os fatos descritos no livro. Por não possuir personagens ou enredos, ele se torna um livro apenas para ser "sentido" naquele momento de leitura, individual, não transponível. Por isso que o que será sentido na leitura, dependerá exclusivamente das suas experiências de vida naquele momento, uma vez que serão essas experiências (ou memórias, para alguns) que irão aflorar loucamente nas páginas entendidas. Então o que digo é: Prepare-se, porque você não será mais o mesmo de antes. 
Por Rodolfo Vilar
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