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O ano da morte de Ricardo Reis (Ou o ano em que me deslumbrei com tal livro)

12/28/2016

 
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Era uma vez um sujeito chamado José Saramago, um homem diferente de sua época, de suas ideias e de seus conceitos. Acontece que esse sujeito de nome José era muito apaixonado pelas odes poéticas de outro sujeito chamado Ricardo Reis, tão apaixonado e deslumbrado que nunca passou pela sua cabeça que Ricardo Reis na verdade fosse Fernando Pessoa. Sendo assim, com a morte de Fernando Pessoa vai-se Ricardo Reis, e nosso amigo admirador dos dois grandes poetas, sendo na verdade apenas um, se encontra tristemente abalado por tal perda. Como sanar tal acontecimento? Como dar voz a figura tão importante que apenas se perde no tempo e no limbo do esquecimento de um criador? A resposta vem simplesmente da solução de escrever sobre a vida de homem não tão comentado e analisado quanto foi Ricardo Reis, um sujeito indiferente, de maneira um tanto apática e de poucas relações, perfazendo-se como um homem altamente culto, movido pelas paixões particulares e dono de uma inteligência sagaz. Somente Saramago para conseguir transformar um personagem como esse num dos livros mais lidos de seu repertório, como uma forma de ainda deixar mais vivo nosso saudoso poeta.  
 
Para aqueles que não sabem, coisa que acho difícil de acontecer, Fenando Pessoa foi um sujeito obcecado em criar heterônimos para dar voz as suas criações. Mas o que ninguém entende é que Pessoa era realmente fanático, tanto que para isso criava elementos que davam vivacidade aos seus pseudônimos, usando de artifício a criação de personalidades, datas de nascimento e falecimento e inclusive, mapas astrais.  Ricardo Reis, um dos seus principais heterônimos, era um sujeito altamente inteligente e da burguesia, sendo aclamado pelas suas incríveis Odes, onde glorificava suas paixões, sua admiração pela religião grega e inclusive a contemplação pelo corpo feminino. Segundo os registros de Fernando Pessoa, Ricardo Reis morou boa parte do tempo em Portugal, onde nasceu, mas também passou mais de dez anos no Brasil, onde trabalhou como médico, voltando a morar em Portugal sucessivamente. O que intrigou Saramago foi saber que Pessoa não necessariamente deu um ano de falecimento a sua criação, colocando então um ponto de interrogação na mente do autor para criar o famoso livro onde conta os últimos momentos de Ricardo Reis em Portugal, encerrando assim e dando uma história digna ao personagem que o cativou.  
 
Logo no inicio do livro somos desembarcados junto com Ricardo Reis em Portugal, onde o mesmo volta depois de muito tempo para sua terra natal, já que Ricardo descobre que seu amigo, Fernando Pessoa, acaba de falecer. Tendo uma vida de burguesia, Ricardo Reis passa boa parte de seu tempo num famoso hotel da cidade, onde felizmente conhece o amor de sua vida e sua amante, amante essa que pelo destino das mãos de Saramago chama-se igualmente que uma das musas de seus poemas. O momento ápice da história de Saramago é quando Ricardo Reis vai visitar a cova de Fernando Pessoa, onde a partir daí ele passa a receber frequentemente a visita do fantasma de Fernando Pessoa. Desse ponto em diante o leitor irá acompanhar vários diálogos perfeitos entre os dois personagens, além é claro, de saber como a vida de Ricardo Reis se estabelece em Portugal, como ele observa seus amores em sua órbita gravitacional, e claro, entender também o momento politico que o país enfrentava naquela época.  

Para os apaixonados por Fernando Pessoa, ler “O ano da morte de Ricardo Reis” é uma experiência única de entrada no mundo do poeta, onde somos fisgados pela filosofia do Pessoa, na qual o Saramago soube muito bem empregar em seu romance, e também, é claro, os momentos de sua fase de inspiração, desmistificando o ofício do autor como um sujeito transcendental de poderes mágicos. “O ano da morte de Ricardo Reis” transcende o significado do que é um romance para Saramago, trazendo para a narrativa elementos que combinam ficção, historicidade e biografia, mesmo sendo de um personagem criado pela mente criativa de outro sujeito. É uma leitura obrigatória, elementar e subjetiva para muitos admiradores dos dois, ou melhor, dos três sujeitos esplêndidos.  

Por Rodolfo Vilar
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